Instituto de Combate ao Enfarte do Miocárdio
Como Tratamos o Coronário
Quintiliano H. de Mesquita, Cardiologista
O paciente que procura o cardiologista para avaliação do estado cardíaco vem movido por alguma suspeita causada por sintomatologia recente, pelo desejo de checar a sua saúde ou como conseqüência de ocorrências clínicas em pessoas de sua família ou do seu meio social e surpresas fatais em indivíduos aparentemente normais.
Essas pessoas que chegam assim ao cardiologista são facilmente identificadas como em condições fora de seu estado basal e do equilíbrio neuropsíquico, temerosas e assustadas com o veredicto final do examinador. São dominadas pelo medo da transformação súbita de pessoa normal em cardíaco preconceituosamente limitado em seus horizontes, postura e no tempo de sobrevida. Tanto isso é verdade que muitos indivíduos normais e suspeitosos mentalmente quanto a sua integridade cardíaca, permanecem assim e vivem infelicitados pela dúvida atroz, mas não se aproximam do cardiologista porque simplesmente temem ser obrigados a penetrarem nas trevas de um horizonte sombrio, com mudanças drásticas e percurso por sofridos caminhos para um futuro incerto e de poucas esperanças.
Um simples exame cardiológico de breve duração é sempre ornamentado pela condição psicológica de ser ou não ser, de estar ou não estar, de sofrer ou não sofrer, de entrar na escuridão da dúvida e sair para o clarão da certeza, da euforia e do momento de felicidade ou sair dali mutilado e inferiorizado com uma sentença de nova condição de cardíaco recém-criado, desmoronado dentro de si mesmo e atônito para caminhar no próprio destino, na direção do desconhecido sob o imponderável reacional do instinto de conservação que passa a presidir a sua vontade e reações conscientes e inconscientes, emprestando-lhes forças para decisões frente a verdade.
Nessa altura dos acontecimentos, o coronariopata ou o coronário como geralmente o designamos, sem o sufixo deprimente de patia ou doença, torna-se vulnerável e experimentando o momento crucial de fraqueza absoluta, mas movido pela confiança e vigorosa fé, transfere o comando hipnótico a seu novo guia, o cardiologista que, por dever de sagrado ofício, passa a conduzi-lo; e, como autômato e hipnotizado, passa a receber em curta sessão de esclarecimento complementar a verdadeira informação sobre a sua condição clínica resultante, essencialmente, de predisposição genética, sua vida de participação ativa frente às diversas situações diuturnas, dentro de novos parâmetros e de conduta, tendo como objetivo a exclusão dos fatores de risco de agravantes para sua capacidade física.
A terapêutica medicamentosa deve ser justificada quanto ao sentido de caráter permanente, objetivando a necessidade da preservação do estado funcional do coração e da prevenção contra as complicações futuras, garantindo assim a ajuda necessária aos recursos da própria Natureza, envidados no sentido de automática e espontaneamente e no momento preciso, contornar os efeitos miocárdicos do processo obstrutivo aterosclerótico progressivo que caracterizam a coronariopatia crônica, desenvolvendo uma circulação compensatória colateral, constituída por novos vasos arteriais abertos e ampliados pela necessidade de suprimento sanguíneo vital para as regiões miocárdicas dependentes dos vasos diretamente afetados e assim efetivamente substituídos pela nova rede de auto-revascularização miocárdica.
É importante fornecer a informação sobre a história natural da doença coronária crônica, respeitando o equilíbrio neuropsíquico do paciente, não superestimando a incidência da probabilidade do enfarte agudo do miocárdio e de outras complicações, como tem sido observado em manifestações do grupo intervencionista, porque é sabido que, obrigatoriamente, a coronariopatia não tem o enfarte como o seu destino. Portanto, o paciente deve ser informado sobre os procedimentos de pesquisa diagnóstica e de terapêutica médica e cirúrgica, momento em que o mesmo deve ser cientificado com toda franqueza sobre a filosofia que norteia a conduta do seu cardiologista e sua posição quanto aos demais métodos de tratamento e diagnóstico para que o paciente tenha o sagrado direito de escolha, livre de tensões agravantes e sentenças de sofrimento e morte.
Nosso procedimento, há mais de quarenta anos, mantém-se - do ponto de vista diagnóstico - da maneira mais simples e suficiente para uma assistência racional e sem redundâncias confirmatórias; fundamentamos o diagnóstico na história da doença atual, na pesquisa eletrocardiográfica condizente com o caso, radioscopia do tórax e o reconhecimento da bioquímica sangüínea como ponto de partida.
O caso é assim identificado e a terapêutica é medicamentosa, representando o que podemos de melhor oferecer com a intenção de atender e amparar a condição miocárdica, completando os efeitos da circulação colateral coronária, na preservação funcional miocárdica e prevenção do enfarte miocárdico, insuficiência cardíaca e acidentes arrrítmicos graves e a morte súbita.
Assim, não nos interessamos pelos métodos que visam modificar diretamente a anatomia patológica coronária através da angioplastia coronária transluminal e/ou implantação de ponte safena ou anastomose de artéria mamária, porque estamos habituados a tratar de casos rejeitados pela cirurgia cardíaca com coronárias severa e totalmente obstruídas com colateralização coronária bem desenvolvida, registrando-se longa sobrevida e sem ocorrência de enfarte ou reenfarte.
Faz-se necessário que os cardiologistas clínicos retornem ao equilíbrio de nossos antepassados e a verdadeira condição do respeitoso e hipocrático "Primum non nocere", abandonando essa aventura cirúrgica que não atende aos verdadeiros objetivos e nem alcança os resultados da terapêutica clínica, verdadeiramente ajustada às necessidades do coração frente a coronariopatia crônica e conseqüente miocardiopatia isquêmica, assistindo a Natureza que é sábia e pródiga nos seus valiosos e vitais recursos.
Vejamos os três estágios da evolução da coronariopatia crônica como são tratados e acompanhados por nós a partir de 1972, sob o enfoque da Teoria Miogênica.
Primeiro estágio No primeiro estágio da coronariopatia crônica assintomática, em que o processo de angina do peito se apresenta como estável a insuficiência coronária relativa a partir de certo grau e intensidade é reconhecida pelo aparecimento da dor retrosternal com ou sem irradiação, produzida pelo esforço físico desenvolvido, representando maior demanda do trabalho do coração e reduzido suprimento sanguíneo pela rede coronária afetada pela aterosclerose, em vias de processo obstrutivo e também frente ao estresse psicoemocional e auto-elaboração de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) representando também aumento da demanda de maior trabalho do coração.
Nessa condição, o paciente não esclarecido apresenta-se confuso e temeroso com o processo doloroso não bem identificado, carecendo de informação segura sobre o mecanismo em jogo, a qual deve inverter completamente a sua concepção sobre o aparecimento da dor; fornecendo-se ao mesmo a noção de que o sintoma é um fenômeno de advertência e que lhe servirá sempre como proteção, indicando um comportamento acima de suas condições cardiovasculares, tratando-se pois de um aliado para uma convivência pacífica e proveitosa. A informação sobre o aparecimento da dor traz segurança ao paciente anteriormente desamparado por causa da desinformação e passa a constituir o suporte psicológico que o cardiologista estabelece para o anginoso viver melhor e adaptado a vida normal dentro dos seus parâmetros. O anginoso fica sabendo assim do quanto pode fazer e ajusta-se à terapêutica medicamentosa que se destina, segundo o nosso conceito fisiopatológico, a atender à melhoria da circulação coronária por circulação colateral automática e espontânea, preservando a função ventricular perturbada por áreas de reduzida contratilidade, em confronto funcional com outras áreas de miocárdio normal, principalmente no momento das ocorrências isquêmicas provocadas pelo esforço físico ou emoções súbitas e incontroláveis.
A associação do cardiotônico e dilatador coronário preconizada por nós desde 1972, tem por objetivo essencial a preservação funcional do miocárdio ventricular por inteiro e como suporte necessário aos efeitos da circulação colateral coronária impedindo a deterioração funcional e estrutural das regiões miocárdicas submetidas cronicamente ás repetidas manifestações isquêmicas e prevenir contra a evolução das condições miogênicas, a nosso ver, responsáveis pela instalação do enfarte agudo do miocárdio ou insuficiência cardíaca, atuando como proteção efetiva ao miocárdio comprometido no seu inotropismo e nivelando-o com o miocárdio normal circunvizinho.
Dentro do nosso enfoque o fundamental é preservar o músculo cardíaco sob o cardiotônico, porque mesmo diante de coronárias pérvias mas ateroscleróticas, recanalizadas ou revascularizadas pelo homem, a miocardiopatia isquêmica oferece à observação clínica a instalação do enfarte agudo do miocárdio, denominado por Bulkley como o enfarte paradoxal por coincidir frontalmente com ponte de safena pérvia, tão paradoxal para nós como a ausência do enfarte frente a coronárias completamente obstruídas até nos três ramos coronários epicárdicos, só significativamente protegidas e substituídas por vasta circulação colateral coronária.
O suporte psicológico ao paciente anginoso é tão importante que se pode freqüentemente registrar o paciente tornar-se assintomático no período inicial do seguimento clínico em que chegamos a utilizar só o placebo, demonstrando assim a vantajosa e necessária ligação médico-paciente, capaz de influenciar o mecanismo da produção da dor ou, pelo menos, melhorar a sua tolerância ao esforço e emoções determinada pela autoconfiança.
É preciso impor ao paciente um regime de vida normal sob tratamento medicamentoso permanente, controle médico não muito freqüente e segundo suas próprias necessidades, para que assim se liberte do estigma de uma doença avassaladora. Deve adquirir consciência de tratar-se de uma condição comum a milhões de pessoas que transitam normalmente pelo mundo afora, sem queixas e apenas diferentes dos bem informados e tratados, quanto ao risco da ignorância dos fatos constantes da própria condição clínica e pela falta dos medicamentos essenciais que garantem o presente e o seu futuro.
Os retornos programados pelo cardiologista e os exames subsidiários repetidos a curto prazo, freqüentemente levam o coronário a neurose cardíaca por instabilidade psíquica que compromete sua autoconfiança.
Não exigimos de nossos pacientes para a suficiente avaliação do seu estado mais do que o controle clínico, radioscópico e eletrocardiográfico em repouso quando já alterado ou com esforço somente quando o ECG de repouso é normal.
Não temos a curiosidade de saber sobre o estado anatômico de suas coronárias pela cineangiocoronariografia, porque qualquer que seja o grau de comprometimento da rede coronária e do ventriculograma ou mesmo a normalidade prevista na síndrome X ou de angina microvascular, nossa terapêutica será essencialmente a mesma.
Temos uma certa predisposição a incluir a Doppler-ecocardiografia em nossa pesquisa, mas ainda não a prescrevemos senão nos processos de aparente comprometimento orovalvular concomitante; achamos que a pesquisa sobre a motilidade ventricular está progressivamente se mostrando promissora.
A cintilografia miocárdica ainda não nos seduz e não é muito acessível a grande maioria dos casos observados.
A terapêutica é simples e permanente, aliada a correção de casos que apresentam distúrbios metabólicos: hiperlipidemias e diabetes mellitus; tratamento da hipertensão arterial e proscrição do abuso do fumo e do álcool.
Não empregamos antiagregantes plaquetários (ticlopidina, dipiridamol e aspirina).
Recentemente, fizemos o levantamento de apreciável grupo de pacientes (684 pts de angina do peito estável (573 pts, 83,8%) e de coronariopatia assintomática (111 pts, 16,2%), admitidos no período de dezessete anos (1972-1989), tratados pela associação do cardiotônico e dilatador coronário antagonista do cálcio. Os casos que vinham sendo tratados antes de 1972 e que foram observados só com a administração de dilatador coronário, expressaram uma sensível melhora em sua tolerância frente ao esforço após a adição do cardiotônico, passando a apresentar a angina de esforço com o esforço desencadeante maior e em muitos casos a fenomenologia desapareceu completamente frente a atividade diária desenvolvida.
Desses 684 pts, 393 (57,5%) mostravam ECG anormal em repouso e 291 pts (42,5%) exigiram a prova de esforço (trinta subidas no duplo degrau) para comprovação diagnóstica.
A terapêutica era instituída com a administração da Proscilaridina-A na dosagem de 0,50-0,75 mg/dia de início e posteriormente aumentada para 0,75-1,0 mg/dia, prescrevendo-se até 1,50 mg/dia nos casos de sintomatologia mais freqüente e frente a esforços menores. Nos portadores de hipertrofia cardíaca e reduzida tolerância aos esforços, temos dado preferência ao emprego da Digital, em doses médias sob a forma de Acetildigoxina ou Lanatosideo-C na posologia de 0,50 mg/dia, Digitoxina 0,1 mg/dia, Digoxina 012-0,25 mg/dia e Betametildigoxina 0,10-0,20 mg/dia.
Entre os dilatadores coronários antagonistas do cálcio utilizados por via oral, temos o Verapamil na posologia de 120-240 mg/dia, Nifedipina de 20-30 mg/dia, Fendilina de 100-150 mg/dia, Prenilamina de 120-180 mg/dia e Diltiazem do 90-180 mg/dia.
Em virtude da interação da Digoxina e Verapamil, com aumento da concentração de Digoxina no sangue, tem sido tomado o cuidado de administrar-se posologia menor da Digoxina na associacão ao Verapamil.
O emprego dos Nitratos de ação rápida, por via sublingual, é livre e de acordo com as manifestações sintomáticas, principalmente naquelas desenvolvidas por estresse psicoemocional.
O repouso de pelo menos uma hora no período pós-prandial é muito importante nessas condições clínicas, visando evitar-se a soma de cargas físicas sobre o coração isquêmico.
Os pacientes são induzidos ao caráter imprescindível da manutenção diária dos medicamentos, permanentemente, largos intervalos para reexames clínicos, com retornos espontâneos, próprios ao tratamento preventivo de complicações miocárdicas (enfarte, insuficiência cardíaca, graves arritmias e morte súbita), com o objetivo de afastar-se o desenvolvimento da neurose cardíaca em tais pacientes, por serem muito vulneráveis em seu condicionamento psíquico; desde que temos como verdadeiro que a neurose cardíaca depende do cardiologista em conduzir o seu paciente no contexto de sua doença. São induzidos a convivência com o estado coronário e a admitirem a dor do peito como uma aliada e momento de advertência para os desvios de seu comportamento físico ou psicoemocional.
No período de dezessete anos registramos baixos índices de enfarte em 2,1% (15 pts; 4 óbitos), insuficiência cardíaca em 5,1% (35 pts; 15 óbitos) e morte súbita em 3,6% (25 pts), sendo a mortalidade por causas cardiovasculares em 8% (55 pts) com a média de idade no óbito de 72 anos.
Merece registro de que essa população de coronários era de 9,2% (abaixo de 50 anos) e 90,8% (acima de 50 anos), com a média de idade na admissão de 55 anos (25-86a) e ao final da observação de 64 anos (26-96 anos); caracterizando-se a maioria como de pacientes idosos e, naturalmente, mais vulneráveis.
A mortalidade foi de 0% até os 50 anos; de 3,1% dos 50-59 anos; de 7,5% dos 60-69 anos; de 9,2% dos 70-79 anos e de 23,6% acima dos 80 anos. Diante de tais índices e em uma população predominantemente em nível da Cardiologia Geriátrica (459 pts acima dos sessenta anos, 67,1%), não temos necessidade de apelarmos para outras opções não medicamentosas, porque a sobrevida alcançada dentro do nosso comportamento essencialmente clínico, leva-nos a admitir que na coronariopatia crônica, quando somos solicitados a participar já o processo de miocardiopatia isquêmica está constituído e então devemos nos preocupar em assegurar o bom tônus miocárdico e deixarmos que a Natureza assuma a sua parte, desenvolvendo a auto-revascularização do miocárdio, através de uma rede de circulação colateral coronária, espontânea, automática, no momento propício e local preciso. Cuidamos da função ventricular e procuramos produzir as condições necessárias à prevenção do enfarte agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca e de condições que geram intolerância isquêmica miocárdica, pró-arritmias e morte súbita.
O médico deve ter a sensibilidade e a necessária coragem de seguir os seus próprios princípios e escolher os seus caminhos pelo que se apresentar como o melhor para seus assistidos, que se entregam de corpo e alma, para confortável segurança e melhores resultados.
Segundo estágio: Durante trinta e um anos lutamos contra a angina pré-enfarte, espontânea, em crescendo, resistente a todas as formas do tratamento, de fácil interpretação diagnóstica e prognóstico muito reservado, pois quase sempre terminava em enfarte ou morte súbita e em poucos casos perdurava por vários meses rotulados então como casos de estado anginoso permanente. Nesse período tivemos a frustração do fracasso terapêutico a despeito de corretos diagnóstico e prognóstico de enfarte iminente ou graves complicações e morte.
Falhávamos clinicamente a curto prazo, e sentíamo-nos impotentes e temerosos com a incontrolável condição de angina espontânea que não respondia aos nitratos de ação rápida por via sublingual, aos anticoagulantes orais e dilatadores coronários.
Ainda hoje, muitos desses são considerados de urgência e indicação para a implantação de ponte de safena ou de mamária e nem mesmo assim deixam de evoluir para o enfarte perioperatório em curto prazo ou morte súbita.
Particularmente, assistimos muitos desses casos antes de 1972 e submetíamo-nos a luta inglória, marcada sempre pelo insucesso terapêutico, mas com conhecimento de causa.
Em dois casos de estado anginoso permanente, pelos idos de 1948 e 1952, pedimos ao Prof. Eurico da Silva Bastos que os submetesse a cardiomentopexia de O'Shaughnessy. A transformação dos casos foi imediata e tornaram-se assintomáticos com a suspensão de todos os medicamentos. A despeito de tais resultados não pensamos em estender tal cirurgia a todos os casos de coronariopatia crônica, porque sempre admitimos ser pacífica a evolução dos coronários, depositando nossa esperança na circulação colateral coronária para a boa evolução dos casos.
Naqueles dois casos paramos a medicação e a evolução foi tranqüila; em um dos casos o óbito ocorreu 6 anos depois por câncer do intestino. No outro, o sucesso foi absoluto e duradouro e o paciente de bancário passou a motorista de praça, trabalhando cerca de doze horas por dia. Tempos depois, com a introdução da cineangiocoronariografia em nosso país, foi o mesmo examinado e então constatada a obstrução de 80% na artéria coronária descendente anterior esquerda. Esse paciente foi reexaminado em 1979 e não tinha queixas, mantendo-se sem qualquer medicação e sem sintomatologia.
Em 1972, quando da elaboração de nossa nova filosofia sobre a fisiopatologia e terapêutica dos diversos estágios da coronariopatia crônica, experimentamos a grata satisfação com nossa primeira vitória sobre a angina instável, em um empresário de 58 anos de idade, que vinha sendo tratado fazia quinze dias de síndrome intermediária, sobre a qual o paciente se manifestava dizendo tratar-se de doença que não cedia com a terapêutica encetada até então. Recebemos o paciente como se fosse um predestinado, de que carecíamos para a comprovação de nossa nova filosofia terapêutica, dois dias após a elaboração da mesma e animava-nos a oportunidade de sua introdução com a administração do cardiotônico, tido como contra-indicado nos processos isquêmicos agudos sem insuficiência cardíaca por condicionar o aumento do consumo de oxigênio e possivelmente piorar as condições miocárdicas. Elegemos a Estrofantina-K 1/4 mg + Dipiridamol 20 mg com ou sem solução glicosada a 25%, como a nova terapêutica da síndrome intermediaria porque admitíamos a existência de insuficiência miocárdica regional, como fundamento essencial dessa síndrome e certamente estaríamos tratando do miocárdio carente do cardiotônico. Decidimo-nos por seu emprego naquele primeiro caso, partindo do raciocínio de que tais casos desde que suportavam uma operação para o implante da ponte de safena, deveriam suportar uma simples injeção endovenosa de Estrofantina que em graves enfartes do miocárdio proporcionara tantos êxitos e a salvação de pacientes em grande risco. Recebemos aquele paciente como uma dádiva especial e a medicação foi executada durante dez dias e em seu próprio domicilio. Ao final do prazo, o paciente retornou eufórico contando que tudo cessara após a primeira injeção. Havíamos assim confirmado nossa proposição depois de trinta e um anos de frustrações com o insucesso permanente da terapêutica que se destinava tão somente aos aspectos coronários e foi justamente cuidando do estado funcional do miocárdio ventricular que atingimos êxito absoluto logo no primeiro caso.
Quando uma terapêutica é bem-sucedida não cabe ignorá-la, mas sim, procurar explicar o mecanismo de ação que, no caso, não se ajusta às proposições do mecanismo fisiopatológico sugerido como decorrente do vasospasmo coronário ou de trombose coronária, que não se beneficiariam com o cardiotônico assim empregado. Esse primeiro caso era de paciente sem enfarte prévio e o segundo caso surgiu logo depois. Observado também em condições especiais um ano depois do ter enfartado, apresentava-se em nosso serviço hospitalar, trazido por colega e ex-assistente nosso, para tratamento de síndrome intermediária que datava já de 10 dias e resistente a medicação em voga. Submetido a nossa nova rotina, registramos a cessação imediata daquela aterradora sintomatologia de pré-enfarte também após a primeira injeção, consolidado o sucesso absoluto com a série de dez injeções. Daí em diante os casos se sucediam em nossa Unidade Coronária. Devemos registrar aqui outro caso especial, que apresentava angina instável, resistente a terapêutica da época durante nove meses e sob tratamento clínico pela equipe de cirurgia cardíaca que tencionava submetê-lo a implantação de ponte de safena. Entretanto, submetido o paciente ao estudo cineangiocoronariográfico, o resultado foi desanimador, porquanto as três artérias coronárias epicárdicas maiores se achavam completamente obstruídas. Em sua história clínica havia enfarte do miocárdio dez anos antes (aos cinqüenta anos de idade) e a angina instável com a duração de nove meses. Liberado pela equipe que o assistia, na primeira crise anginosa espontânea mais demorada foi o paciente internado de urgência em nossa Unidade coronária e cerca de três horas depois de medicado seguindo a nova rotina do Serviço, fomos encontrá-lo em momento de excepcional euforia, experimentando em nove meses uma tarde sem sintomas, a partir da injeção que fizera no momento de internação. Esse paciente teve uma sobrevida tranqüila de treze anos (vinte e três anos após o enfarte), tendo falecido em conseqüência de acidente vascular cerebral aos 73 anos de idade.
Nossa casuística já publicada conta com 199 pts, muitos tratados a distância e depois confirmados pessoalmente. Da série de dez dias com a Estrofantina endovenosa (1/4 mg), passamos a cinco dias e em seguida a terapêutica de manutenção feita com a Proscilaridina-A ou Digital associada a dilatador coronário, de preferência. antagonista do cálcio. Como tratamento de ataque temos empregado alternativamente o Lanatosideo-C (0,40 mg) ou Digoxina (0,50 mg) por via endovenosa, durante cinco dias, ou mesmo Digital ou Proscilaridina-A, por via oral, em doses médias observando-se a sustação imediata do processo instável; tudo isso nos tem levado a admitir que o tratamento é baseado no cardiotônico, porque o importante é preservar a função ventricular in totum em seu inotropismo, evitando-se a degradação funcional da estrutura miocárdica regional, responsável pela angina instável, manifestações episódicas de isquemia silenciosa e pelo enfarte agudo do miocárdio.
Inauguramos uma nova era para o tratamento da angina instável que é o estágio do pré-enfarte, registrando então o agente eletivo para a prevenção imediata do enfarte agudo do miocárdio e restabelecendo a estabilidade na coronariopatia crônica. A partir daí os casos de angina instável têm sido transformados fácil e prontamente, a sintomatologia desaparece e registra-se o retorno ao quadro de estabilidade sintomática e funcional, com prevenção do enfarte, útil e longa sobrevida. A antiga frustração cessara e fora substituída pelo entusiasmo e euforia da vitoriosa rotina terapêutica.
A ação do cardiotônico na angina instável evidentemente vem situar o mecanismo desencadeante e fisiopatológico como miogênico - insuficiência miocardica regional - porque a sustação imediata do processo sintomático e evolvente para o enfarte agudo do miocárdio não poderia ocorrer diante do processo trombogênico ou vasospástico; assim, temos considerado o cardiotônico como o agente terapêutico específico.
Desde então, não temos mais casos de angina instável resistentes a terapêutica medicamentosa. No entanto, tem nos sido dado observar curiosos casos de estado anginoso que apelaram para nós em desespero de causa, os quais foram analisados, interpretados e solucionados como decorrentes de defeitos de técnica terapêutica, como: 1) excesso de dilatadores coronários em uso exclusivo ou 2) associados ao cardiotônico; 3) administração simultânea do cardiotônico (Digital), bloqueador betaadrenérgico e dilatador coronário.
A solução tem sido rápida e simples em todas as modalidades referidas: a) administração de um só dilatador coronário e a adição do cardiotônico; b) um só dilatador e manutenção do cardiotônico; e c), suspensão do bloqueador beta-adrenérgico e manutenção do cardiotônico e dilatador coronário; a cessação da sintomatologia tem sido a regra e o número de casos dessa natureza, significante.
Em todos os casos de angina instável, nosso procedimento terapêutico tem sido simplesmente rotineiro com a administração do cardiotônico associado ao dilatador coronário antagonista de cálcio; essa associação deve eliminar o efeito inotrópico negativo do antagonista de cálcio. No tocante ao Verapamil ocorre aumento do nível plasmático da Digoxina que tem nos levado à posologia mais baixa, quando associados.
Não administramos medicamentos antiagregantes plaquetários (Ticlopidina, Dipiridamol ou Aspirina) em nenhum dos estágios da coronariopatia crônica porque nos baseamos exclusivamente na preservação da função ventricular e do inotropismo das áreas de miocardiopatia isquêmica, como prevenção do enfarte miocárdico, insuficiência cardíaca e morte súbita, dando o suporte necessário para a efetiva participação da rede colateral coronária como auto-revascularização miocárdica de áreas críticas.
Em nossa experiência, a partir de 1972, não temos mais casos de angina recorrente e resistente a terapêutica medicamentosa por instabilidade sintomática, própria do segundo estágio da coronariopatia crônica, porque nosso tratamento específico para a preconizada insuficiência miocárdica regional primária e espontânea, tem resolvido o caso rápida e prontamente, garantindo a reversibilidade do processo a estabilidade funcional e sintomática. Desde então temos recebido em nossa clinica privada apreciável número de casos com aparente angina instável, estado anginoso permanente e resistente a terapêutica prescrita. Deles merecem destaque dois casos portadores de pontes de safena e de implantes de mamárias (um médico e um advogado) que nos procuraram por desespero de causa. Ambos foram aliviados em poucos dias, um após a supressão da excessiva quantidade de dilatadores coronários (3 dilatadores coronários com posologia elevada e empregados simultaneamente com diurético e cardiotônico), sendo mantido o digitálico e um dilatador coronário e o outro com a supressão do bloqueador beta-adrenérgico que vinha sendo administrado juntamente com o cardiotônico e dilatador coronário. Isto porque, em nossa experiência, temos observado a instabilidade sintomática diante de tal associação e a sua cessação com a simples eliminação do bloqueador, parecendo-nos haver incompatibilidade por efeitos antagônicos, muito embora a experimentação em animal pareça indicar compatibilidade de ambos agentes terapêuticos. Na prática, freqüentemente a teoria é outra e o imediato alívio de tais casos com a cessação completa do estado anginoso dentro de dois a três dias tem-se repetido em outros casos clínicos, como os aqui referidos e que reforçam as medidas postas em prática.
Assim, muitos casos com tais características clínicas são tidos como mal observados e debitados os insucessos a terapêutica medicamentosa, erroneamente interpretada como ineficaz, quando na realidade são insucessos por defeitos de técnica terapêutica: excesso de dilatadores coronários ou nítida incompatibilidade medicamentosa - bloqueador beta-adrenérgico e cardiotônico só observada no homem; todavia, na prática casos dessa natureza são levados a cirurgia revascularizadora como medida heróica, quando na verdade carecem do cardiologista com mais vivência e sensibilidade.
Podemos afirmar com toda tranqüilidade que os casos tidos como resistentes a terapêutica medicamentosa e caracterizados pela instabilidade sintomática, na verdade refletem incompetência médica e desajustes terapêuticos e nunca uma ausência de resposta a medicação específica ou bem administrada com posologia precisa.
Terceiro estágio. Admitindo-se o enfarte agudo do miocárdio como decorrência primária da falência contrátil regional do miocárdio, sede de miocardiopatia isquêmica, em caráter irreversível, desencadeando secundariamente a estagnação circulatória e isquemia miocárdica absoluta, o enfarte se processará de maneira variável na área isquemiada e em graus diferentes.
Portanto, procurando-se atuar com o cardiotônico, as áreas viáveis poderão responder e serem salvas do processo necrótico e o miocárdio assim ativado pode impedir a trombose coronária secundária que se instala por causa da estase circulatória no ramo coronário satélite da região enfartante.
Dessa maneira, podemos pensar que o cardiotônico, atuando precocemente, teria um efeito protetor miocárdico, capaz de salvar áreas isquêmicas prestes a sofrerem transformações mais severas que se encaminham para o processo de degradação miocárdica e necrótica. Ademais, como conseqüência dessa nossa atitude pudemos verificar uma radical transformação na evolução dos sucessivos casos de enfarte, constituindo uma casuística de 1290 pacientes tratados no período de março de 1972 a dezembro de 1979.
A priori, tínhamos a impressão de que o enfarte agudo do miocárdio sendo decorrente do mecanismo fisiopatológico miogênico, a partir da falência regional, sem condições de reversibilidade espontânea como é preconizado para o mecanismo da angina instável, quando começa a ser tratado precocemente, dentro de poucas horas da instalação do quadro clínico, ainda pode haver a oportunidade de se recuperar parte da área miocárdica isquêmica e destinada a ser lesada em maior profundidade e extensão, quando deixada a própria sorte. Pode-se admitir que, no momento em que se administra o cardiotônico, cessaria a falência miocárdica das áreas ainda viáveis, sustando a evolução para a necrose ou reduzindo a área de necrose.
Verificamos com rara felicidade que o cardiotônico não desenvolvia arritmias, reduzia a necessidade do emprego de antiarrítmicos (Lidocaina), de analgésicos e entorpecente; bem como reduziu de muito a incidência de morte por paradas cardíacas (4,5%), do choque cardiogênico (2%) e obviamente, da insuficiência cardíaca (0,4%), sendo a mortalidade global de 12,3%.
No tocante as reações enzimáticas seriadas registramos: 67% dos casos com níveis inferiores a três vezes o nível superior normal e 33% com níveis superiores ao referido parâmetro, o que nos parecia indicar a variação do tamanho do enfarte, com diminuição da área prevista a ser enfartada na maioria dos casos, impressão esposada também por Pizzarello e col. (1975) e Morrison e col (1976); uma vez que reações enzimáticas até duas vezes o nível superior normal não se considera como indicação da presença de enfarte agudo, porque tal nível tem sido observado em casos de angina instável.
Depois do emprego rotineiro do cardiotônico no enfarte agudo do miocárdio a evolução eletrocardiográfica foi nitidamente alterada. Antes observava-se na repolarização ventricular (segmento RS-T e onda T); desnivelamento do segmento RS-T + onda T como onda monofásica, seguida de normalização do segmento RS-T e onda T pontiaguda no sentido inverso do desnivelamento inicial, a qual quando negativa assumia padrão coronário, assim permanecendo indelével ou com regressão muito lenta para a normalidade, em meses e até anos depois do enfarte.
Das alterações do complexo QRS quando o enfarte é frontal ao eletrodo explorador a deflexão QR ou QS sempre era definitiva ou, pelo menos, duradoura. Sob a nova rotina terapêutica, começamos a registrar uma tendência a recuperação da deflexão R - acidentes "r" embrionários - em regeneração progressiva até a normalização em tempo variável e às vezes até a curto prazo.
Quanto as alterações do segmento RS-T e onda T, passamos a registrar quatro estágios rápidos de quatro - cinco dias, caracterizados no enfarte anterior e derivações precordiais da seguinte maneira:
1) Segmento RS-T e onda T no mesmo sentido (monofásicos); 2) Segmento RS-T nivelado e onda T negativa e coronária de curta duração; 3) Segmento RS-T de novo desnivelado (+) e onda T (+); 4) Segmento RS-T de novo nivelado e onda T negativa mas, sem aspecto coronário como padrão residual.
Como conseqüência de todas as modificações da evolução do enfarte agudo, passamos a considerar dois grupos de pacientes, respectivamente, em que as reações enzimáticas se mostravam com níveis inferiores a três vezes o nível superior normal como indício de enfarte sustado (Grupo um) e aquelas com níveis superiores como enfartado mas atenuado (Grupo dois).
No Grupo um cerca de 20% tinham enzimáticas normais e por isso eram interpretados como casos de enfarte evitado. Ainda de acordo com essas estimativas, deliberamos sobre a deambulação revolucionária para a época: no Grupo um, o paciente levantava-se no quinto dia e tinha alta hospitalar no dia seguinte; no Grupo dois, o paciente levantava-se no décimo dia e tinha alta hospitalar no dia seguinte. Antes daquela mudança nossos pacientes ficavam em repouso absoluto durante cinqüenta dias, em seus domicílios e tínhamos um índice de mortalidade baixo (7,7%).
Na coronariopatia crônica, aquele que é identificado como ainda no primeiro estágio de estabilidade sintomática e funcional, procurava-se prevenir o enfarte e as outras complicações com a administração imprescindível do cardiotônico, que nos pacientes do segundo estágio tem sido responsável pela sustação do processo agudo e prevenção imediata do enfarte. Conseguiu-se uma vitória bem significativa para nós e deve manter-se assim dentro da estabilidade sintomática obtida pelo cardiotônico como o agente terapêutico específico desse estágio. Da mesma maneira, o enfartado que sobreviveu a crise aguda readquire a estabilidade e deve procurar manter-se buscando prevenir novo enfarte, insuficiência cardíaca e graves arritmias e morte súbita por intolerância miocárdica frente aos episódios isquêmicos impostos pelos próprios pacientes.
Essas três condições recebem a mesma terapêutica medicamentosa - cardiotônico e dilatador coronário - reeducação comportamental frente as situações várias de sua atividade profissional e social e cuidados frente a todos os fatores de risco (desvios metabólicos, hipertensão arterial, diabetes mellitus) e esporte, com equilíbrio psicoemocional e sem temores. Além disso, em face de qualquer que seja o panorama angiográfico coronário, desde coronárias pérvias, não estreitadas e até obstruídas totalmente, uma, duas ou três coronárias maiores epicárdicas.
Nossa intenção é principalmente a preservação da função ventricular, porque na coronariopatia crônica existe comprometimento do inotropismo regional miocárdico, sem insuficiência cardíaca, mas que exige a administração de medicamentos inotrópicos positivos, enquanto a rede coronária tem recursos próprios eficientes para a auto-revascularização miocárdica, automática e espontânea, no momento azado e em local que mais se faz necessária. Temos assistido a longas sobrevidas em pacientes com obstruções completas dos três grandes ramos coronários epicárdicos com rica rede de colateralização coronária.
Em 1983, publicamos um boletim informativo para o coronário por estarmos insatisfeitos com o que se vinha praticando com os coronariopatas, em quaisquer estágios de sua evolução, sendo caçados no meio clínico e canalizados para os ativos grupos de cirurgia cardíaca e aí manipulados e desrespeitados em sua condição humana, reduzidos a seres em constante perigo de morte e de enfarte iminentes, sem horizontes nem esperanças, a não ser na opção salvadora da ponte de safena ou implante de mamária. Denunciamos que todos os pacientes que se dispõem a fazer um simples check-up cardiológico, sintomáticos ou não, continuam sendo submetidos sistematicamente a cateterismo e cineangiocoronariografia e freqüentemente a angioplastia coronária transluminal com dilatação por balão intracoronário como primeiro tempo e completada por posterior cirurgia, a despeito da existência de uma própria auto-revascularização miocárdica que não é levada em consideração e muito menos respeitada.
Constatamos na atualidade uma situação de fato com o abandono completo do tratamento medicamentoso para a Coronariopatia crônica, a não ser naqueles casos que se apresentam com coronárias anatomicamente normais - síndrome X ou de patologia microvascular com ou sem fluxo lento - que escapam da indicação cirúrgica. E outros, cuja patologia avançada não tem a suprema ventura de receber a indicação da viabilidade de implantação de ponte de safena ou de mamária, cirurgias para casos escolhidos e favoráveis ao método, para que obtenha êxito e não pereça.
Os casos rejeitados são deixados a clínica e geralmente vivem muito mais e melhor do que os eleitos para a cirurgia que passam a receber uma pesada carga medicamentosa, muito maior do que a destinada aos nossos pacientes, tratados essencialmente pela associação do cardiotônico e dilatador coronário, sem a adição de antiagregantes plaquetários. Temos tratado de muitos casos com obstruções completas e simultâneas dos três grandes ramos coronários epicárdicos com longas sobrevidas, enquanto temos observado destroçados casos de curta sobrevida, com pontes de safena e/ou implantes de mamárias pérvias, com função ventricular severamente comprometida por conseqüente dilatação tonógena e miógena ventricular, nos quais as silhuetas ventriculográficas, sistólica e diastólica são quase do mesmo volume, registradas no prazo de um a três anos com ou sem enfarte perioperatório. Tivemos oportunidade de observar alguns casos dessa natureza em que - a partir de ventriculograma normal no pré-operatório em curto espaço de tempo havia se desenvolvido a débâcle completa do ventriculograma e marcados por curta e melancólica sobrevida. São casos que não deram certo, não são publicados e não se deixa publicar para não ameaçarem o método!
Em Cardiologia Clínica são publicados todos os casos observados sucessivamente de qualquer condição clínica, sem escolha nem subtrações manipuladas e apresenta-se o destino de toda casuística; em Cirurgia cardíaca a publicação mostra determinados segmentos e aspectos e os bons resultados; até agora, não vimos nenhuma publicação de casuística completa sobre o destino de todos os casos operados consecutivamente, fornecendo uma idéia global acerca dos casos operados em qualquer Serviço de Cirurgia.
Por causa de tudo isso, através do boletim informativo: "Enfarte. Como tratar e evitar só com remédio", procuramos trazer a público, fornecendo a cada paciente coronário, em linguagem acessível ao leigo, informações e subsídios sobre os recursos da própria Natureza e demonstrar-lhe que esta procura contornar a doença e como deve ser ajudada pelo médico. Trouxemos a seu conhecimento que os medicamentos podem garantir uma vida útil, assintomática e longa com baixa incidência das complicações de sua doença. Procuramos demonstrar que a Clínica tem recursos e que a Cirurgia não a supera neste particular.
A repercussão foi boa e sentimo-nos gratificados com os benefícios e o bem-estar produzidos no seio dos coronários; Os quais se sentem motivados com os conhecimentos que lhes fornecemos e passam a conviver pacificamente com a sua doença, parecendo justificar nosso antigo conceito: "Coronariopata, esse desinformado!" Precisamos estreitar o relacionamento médico/paciente frente a coronariopatia crônica, para que ele viva mais e melhor.
Nota: Este artigo foi extraído de capítulo com o mesmo título do livro "Como escapar da ponte de safena e do enfarte do miocárdio só com remédio", Mesquita, QHde: Editora Ícone, 1991 cujo resumo pode ser visto em http://www.infarctcombat.org/livros/icem.html
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