Instituto de Combate ao Enfarte do Miocárdio

 


 

Médico do Instituto do Coração Alerta: Cardíacos Devem ser Tratados Com Remédios!

 

Whady Hueb, professor e cardiologista do Instituto do Coração do Hospital de Clínicas da USP, alerta em reportagem no Jornal O Estado de São Paulo de 1/10/02 (1) que o tratamento com medicamentos tem um desempenho mais favorável do que a cirurgia de ponte de safena ou angioplastia coronária. Foi o que demonstraram  os achados preliminares do estudo MASS-II (2), apresentados na 50ª reunião científica anual do American College of Cardiology realizada em 18 de março de 2001 em Orlando na Florida, EUA e publicados em maio de 2004 no Journal of the American College of Cardiology  .

 

O estudo MASS-II envolveu 611 pacientes com problemas semelhantes – duas ou três artérias obstruídas, dor no peito constante (angina) e função ventricular preservada. Os pacientes foram selecionados aleatoriamente para tratamento médico, cirurgia de ponte de safena ou angioplastia. O MASS-II é uma continuação do estudo MASS, iniciado em 1988, e que teve duração de 5 anos, envolvendo 214 pacientes. O MASS, publicado em 1995 no JACC (3, 4) e reportado pela revista Veja e pelo Jornal Folha de São Paulo em 1996 (5, 6), não encontrou diferenças na mortalidade e na incidência de enfarte entre os três tipos de tratamento, nesse caso, para a estenose isolada da artéria coronária descendente anterior. O follow-up de 5 anos do MASS foi publicado em 1999 na Circulation (7).

 

O coordenador do atual estudo (MASS-II), doutor Whady Hueb, disse na entrevista ao Jornal Estado de São Paulo “Que em casos semelhantes aos avaliados no trabalho, o tratamento com remédios pode ser considerado como primeira escolha. Mas não é isso o que ocorre. Muitos profissionais optam por medidas mais agressivas antes de tentar os remédios. E os problemas muitas vezes continuam. Em 30% dos pacientes que fazem angioplastia é preciso fazer novas intervenções. No caso da cirurgia, ela abre um caminho para a circulação. Mas, também aí, novas obstruções podem ocorrer”.

 

Após 1 ano de follow-up no MASS-II, a mortalidade foi de 1,5% para os pacientes tratados medicamente, comparada a 3,5% nos pacientes submetidos à cirurgia de ponte de safena e de 4,5% nos pacientes submetidos à angioplastia coronária. O enfarte agudo, não fatal, ocorreu em 3% dos pacientes tratados medicamente, em 2% nos submetidos à cirurgia e de 8% nos pacientes submetidos a angioplastia coronária.

 

Outro aspecto estudado no MASS-II foi quanto ao impacto do tratamento na qualidade de vida dos pacientes. Neste caso a cirurgia de ponte de safena apresentou melhor desempenho entre os 3 tipos de tratamento. O professor Desidério Favarato, que conduziu esta etapa do estudo no Incor, disse à reportagem que “Os pacientes operados têm menos queixas de problemas físicos provocados pela doença ou limitações de suas atividades. Consideram, enfim, que seu problema está resolvido”.

 

O estudo MASS-II vem confirmar o que já mostraram diversas outras pesquisas antigas e recentes que apontaram a ineficácia da cirurgia de ponte de safena e da angioplastia coronária na prevenção do óbito prematuro ou do enfarte. Isto, mesmo sendo acompanhados de pesada carga de remédios, superior aquela dada aos pacientes tratados só com remédios. O que cabe perguntar: Qual seria o resultado desses procedimentos invasivos se não fossem os remédios que os acompanham?

 

Vale lembrar as conclusões do extenso trabalho de revisão dos pesquisadores Henry D McIntosh e Jorge A Garcia sobre a Cirurgia de Ponte de Safena, publicado na Circulation em 1978 sob o título The First Decade of Aortocoronary Bypass Grafting, 1967-1977 (8), onde os autores colocam:

“A despeito da baixa mortalidade operatória e freqüência na oclusão dos enxertos, os dados disponíveis na literatura não indicam que a melhora inicial na sintomatologia persista, ou que o enfarte do miocárdio, arritmias, ou insuficiência cardíaca serão evitados, ou que a vida será prolongada na vasta maioria dos pacientes operados”.

 

No tocante a melhoria da qualidade de vida, única vantagem atribuída no MASS-II à cirurgia de ponte de safena, ela é bastante questionável tendo em vista que:      

  1.  Em substancial parte dos pacientes o alívio nos sintomas da angina não persistem muito tempo. Também, as pontes de safena tendem a obstrução levando a re-operações em muitos pacientes com a implantação de novas pontes.

  2. Uma das maiores razões para o alívio da dor é a do efeito placebo (fator psicológico) provocado pela cirurgia de grande porte, que leva os pacientes a se sentirem como se estivessem curados. Outras razões apontadas são a manipulação cirúrgica de vasos e epicárdio (neurectomia sensorial), produção de enfarte tornando o músculo isquêmico em cicatriz, mudanças no estilo de vida após a cirurgia, etc... (Ver em denúncia-13)

  3. Sendo os custos e riscos da cirurgia bastante elevados, nos levam as seguintes considerações: 1) Como dizer que a cirurgia de ponte de safena melhora a qualidade de vida quando estão documentados em vários estudos uma alta incidência de derrames, desordens cognitivas, mortalidade ou enfarte no peri-operatório, alívio apenas temporário dos sintomas da angina e taxas mais altas de morbidade e mortalidade no curto, médio e longo prazo? 2) Como pode ser valorizado o aspecto da qualidade de vida, quando se é colocada a própria vida em risco? 3) Como desconhecer que alguns tratamentos médicos usados na doença coronária têm alcançado índices de mortalidade menores do que 1,5% ao ano, isto é, muito mais baixos do que os tratados através de cirurgia de ponte de safena ou de angioplastia coronária? (Ver em polêmica-20)

  4. Notar especialmente que, no Estado do Rio de Janeiro, durante os anos de 1999 a 2003 (cinco anos) a mortalidade hospitalar média foi de 7,5% para a cirurgia de ponte de safena e de 1,7% para a angioplastia coronariana. No Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia durante o período entre 1999 e 2003 em um grupo de 2032 pacientes submetidos consecutivamente à cirurgia de ponte de safena, a mortalidade hospitalar total foi de 4,1% para homens e de 6,3% para mulheres enquanto a taxa de enfarte agudo do miocárdio foi respectivamente de 5,3% e 6,3%  (10, 11).

Referências:

  1. Cardíacos: tratamento com remédios pode ser melhor. Ligia Formenti, O Estado de São Paulo, 01 de outubro de 2002.

  2. The Medicine, Angioplasty, or Surgery Study (MASS II): A Randomized, Controlled Clinical Trial of Medical Therapy, Coronary Angioplasty, or Bypass Surgery for Multivessel Coronary Artery Disease. Whady Hueb, ACC March 2001; Clin. Cardiol. 24, 416-418 (2001)

  3. The Medicine, Angioplasty, or Surgery Study - MASS: A Prospective Randomized Trial of Medical Therapy, balloon Angioplasty, or Bypass Surgery for single proximal left anterior descending artery stenoses. Whady Hueb et al, J American Coll Cardiol, 1995;26(7):1600-1605.

  4. O Estudo do Tratamento Clínico, da Angioplastia e da Cirurgia (MASS): Um Estudo Prospectivo, Randomizado da Terapêutica Clínica, Angioplastia por Balão ou Cirurgia de Revascularização para a Estenose Única da Artéria Descendente Anterior, Whady Hueb et al, JAAC (Ed. Bras.)1996;2:3 (junho)

  5. Sem cirurgia – Drogas podem substituir operação de safena, Revista Veja, 21 de fevereiro de 1996.

  6. Cirurgia no coração pode ser evitada, Jairo Bouer, Folha de São Paulo, 24 de março de 1996.

  7. Five-year follow-up of the medicine, angioplasty or surgery study (MASS): A prospective, randomized trial of medical therapy, balloon angioplasty, or bypass surgery for single proximal left anterior descending coronary artery stenosis. Whady Hueb et al, Circulation 1999 Nov 9;100(19 Suppl):II 107-13.   

  8. The First Decade of Aortocoronary Bypass Grafting, 1967-1977.A Review, Henry D. McIntosh and Jorge A. Garcia, Circulation, March 1978;57:3

  9. The Medicine, Angioplasty, or Surgery Study (MASS II): A Randomized, Controlled Clinical Trial of three therapeutic strategies for Multivessel Coronary Artery Disease. One-year results. Whady Hueb et al, JAAC May 2004, 43;10:1743-1751

  10. Saúde Cardiovascular na era Tecnológica, Nelson Albuquerque de Souza e Silva. Editorial, Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Vol 83, 6, Dez 2004.

  11. Resultados imediatos da cirurgia de revascularização miocárdica: Comparação entre homens e mulheres, Vivian Lerner Amato e outros, Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Vol 83, Nº Especial, Dez 2004.

Seção Denúncias